Pesquisa com plantas da Mata Atlântica busca combater patógeno capaz de infectar plantações de arroz, feijão, milho e soja

Uma pesquisa desenvolvida pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, encontrou o que pode ser uma solução para combater o fungo Rhizoctonia solani, patógeno capaz de infectar plantações de arroz, feijão, milho e soja, entre outros, causando a podridão radicular.

Plantas de antúrio (Anthurium urvilleanum) localizadas na Mata Atlântica, na Ilha de Palmas, litoral paulista, conteriam uma actinobactéria (tipo de bactéria em forma de filamento), com potencial para controlar o crescimento do fungo. A Streptomyces lunalinharesii foi isolada em laboratório e cultivada in vitro. “Um dos fatores que despertaram nosso interesse por avaliar esta linhagem é que essa espécie de microrganismo é relativamente pouco estudada”, afirmou ao Jornal da USP a bióloga Naydja Moralles Maimone, autora da pesquisa.

Os detalhes são apresentados em artigo publicado na revista cientifica Microbiological Research.  Segundo Naydja é comum na área de pesquisa em produtos naturais de microrganismos que as buscas por novos compostos bioativos, incluindo os de possível aplicação agrícola, envolvam linhagens isoladas em localidades que haviam sido até então subexploradas, como é o caso das ilhas oceânicas, pois microrganismos pouco estudados podem representar grandes oportunidades para se encontrar compostos ainda não descritos na literatura.

O estudo trabalhou também com uma linhagem do fungo Rhizoctonia solani, que foi isolada de uma planta de orégano infectada e cedida pela Embrapa Meio Ambiente, em Jaguariúna (SP). “Este fungo pertence ao filo Basidiomycota e é um fitopatógeno de solo que afeta uma ampla gama de hospedeiros, incluindo diversas culturas economicamente importantes, tais como soja, arroz, feijão, batata, café, milho, gramados e pastagens”, descreve Naydja.

 

“Trata-se de uma espécie que pode causar doenças popularmente conhecidas como ‘tombamento’ ou ‘podridão radicular’, cujo principal sintoma é o estrangulamento da plântula [planta jovem] no nível do solo, logo após a germinação, e a ‘queima’ ou ‘mela das folhas’. No Brasil, por exemplo, perdas de até 60% em plantações de soja já foram atribuídas a este fungo.”

Inicialmente, foi realizado um teste de cocultivo, onde actinobactéria e fungo são colocados juntos para crescer na mesma placa, para avaliar a interação entre os microrganismos e ver se a actinobactéria seria capaz de inibir o crescimento do fitopatógeno. “Houve inibição a distância, o fungo parava de crescer ao se aproximar da colônia da actinobactéria”, aponta a bióloga.

“Constatamos que a linhagem da actinobactéria é potencial produtora de compostos de ação antibiótica, como a anisomicina e derivados, e de sideróforos, que são compostos que reconhecidamente têm papel relacionado ao antagonismo contra fitopatógenos do solo, além de metabólitos de outras classes químicas relevantes.”

 

Em seguida, para atestar o potencial antifúngico dos metabólitos da actinobactéria, os extratos obtidos do cultivo axênico e do cocultivo passaram pelo teste antifúngico conhecido como poisoned food contra o Rhizoctonia solani, no qual o extrato é incorporado no meio de cultivo onde o fungo é inoculado para crescer. “Ambos os extratos testados inibiram o crescimento do fungo, mas a inibição do extrato do cocultivo foi significativamente maior (88,43%) que a do cultivo isolado (axênico) da bactéria (50,83%)”, ressalta a bióloga. “Muitos dos compostos detectados em maior quantidade nos extratos do cocultivo em relação ao cultivo isolado da bactéria não estão presentes nos bancos de dados de produtos naturais. Sendo assim, levantamos a hipótese de que esta actinobactéria é potencial produtora de compostos ainda não conhecidos ou descritos na literatura.”

De acordo com Naydja, os resultados obtidos foram bastante promissores quanto à inibição do fungo avaliado, porém trata-se um trabalho inicial, com testes in vitro. “Mais estudos serão necessários para avaliar a eficácia da linhagem como controle biológico em aplicações no campo”, observa. “Mesmo assim, o trabalho nos mostra o quão elevado é o potencial biotecnológico dos microrganismos que podemos isolar no País, o que reflete a importância da preservação dos nossos ecossistemas e de mais estudos na área.”

* com informações Jornal da Fapesp

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