Durante uma década, o Bonito Blues & Jazz Festival transformou a cidade turística mais badalada de Mato Grosso do Sul em palco para solos de guitarra e vozes roucas ao entardecer. Mas como toda boa música, o festival também resolveu pegar a estrada. Em 2024, o evento deixa as águas transparentes de Bonito para trás e estaciona em Rio Verde de Mato Grosso, a 190 quilômetros de Campo Grande — uma cidade que já foi rainha do turismo regional, mas que há tempos pede para voltar ao mapa.
Agora rebatizado de Bonito Blues in Rio Verde, o festival será gratuito e acontece entre os dias 12 e 14 de julho, com dois palcos, shows nacionais e internacionais, ação social, aula de blues em escola pública e, claro, muita história pra contar.
Uma mudança pensada e sentida
A saída de Bonito não foi súbita. Como em qualquer banda que troca de formação, teve conversa, desgaste e falta de sintonia com a prefeitura local, segundo Afonso Roomiones Jr., coordenador do festival. “Nos últimos três anos ficou difícil continuar por lá. Em Rio Verde, fomos recebidos com entusiasmo. A cidade estava com fome de cultura, e a gente, com vontade de tocar de novo.”
A decisão de mudar de endereço veio acompanhada de uma ideia simples: se a cultura não cabe mais nos velhos palcos, que ela encontre novos.
Do turismo ao território
Rio Verde, como muitos sul-mato-grossenses sabem, já foi protagonista. Antes da explosão de Bonito, era pra lá que famílias iam nos feriados para mergulhar em balneários, fazer trilhas e comprar melado na beira da estrada. Com o tempo, perdeu espaço — mas não perdeu charme.
A ideia do festival, agora, é ajudar a reativar o turismo local, não apenas com música, mas com movimento. A programação inclui apresentações na Praça das Américas, sempre ao fim da tarde, e shows noturnos no espaço Maria Bonito Eventos. A entrada é gratuita, e a trilha sonora é feita por gente de Campo Grande, Dourados, Cuiabá, Florianópolis, Paris, Assunção e Buenos Aires.
A programação (ou quase um roteiro de viagem)
Quinta-feira, 12 de julho
17h – João Martinelli (Dourados-MS)
18h30 – Pé de Garrafa (Campo Grande-MS)
Maria Bonito Eventos
21h – Henrique Maluf (Cuiabá-MT)
23h – Ouma Jazz (Paris, França)
Sexta-feira, 13 de julho
17h – American Radio (Campo Grande-MS)
18h30 – Bêbados Habilidosos (Campo Grande-MS)
Maria Bonito Eventos
21h – John L Brick (Florianópolis-SC)
23h – Underground Blues (Cuiabá-MT)
Sábado, 14 de julho
17h – Los Bagres (Dourados-MS)
18h30 – Miseráveis (Dourados-MS)
Maria Bonito Eventos
21h – Dominique Bernal (Assunção, Paraguai)
23h – Hernán Tamanini & David Tanganelli (Argentina e São Paulo-SP)
Blues na sala de aula
A novidade mais curiosa talvez não esteja no palco, mas na sala de aula. Um dos destaques do festival será o projeto “Blues na Escola”, uma iniciativa que vai levar o músico David Tanganelli, com sua gaita, e o guitarrista Hernán Tamanini até uma escola municipal de Rio Verde para contar a história do blues e tocar ao vivo para estudantes e moradores. Algo que, como bem diz Afonso, “nunca aconteceu antes em nenhuma outra cidade do estado”.
Mais que um show, a ação quer apresentar o blues como uma forma de contar histórias de dor, resistência e superação, temas que cruzam o tempo e os territórios — e que ainda fazem sentido para muita gente, especialmente fora dos centros.
Música que cruza fronteiras
O festival mantém sua vocação multicultural. Tem francês tocando jazz com sotaque do Sena, argentino improvisando na guitarra, paraguaio com influência guarani, e sul-mato-grossenses com o pé no barro e a mão no blues. Tudo isso conectado por um gênero que nasceu nos campos de algodão dos Estados Unidos, mas que encontrou eco nas periferias do Brasil, nos porões das bandas do interior e nas vozes de quem ainda transforma sofrimento em poesia.
“Hoje em dia, com a internet e o custo baixo de gravação, é mais fácil espalhar música boa por aí. O festival ajuda a formar parcerias, criar encontros e fazer o público sair da zona de conforto”, diz Roomiones.
actc