STF suspende parte de decreto que autoriza destruição de cavernas

O ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu nesta segunda-feira (24) trechos de decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL) que autoriza a destruição de qualquer tipo de caverna para a construção de empreendimentos considerados de utilidade pública.

A suspensão atinge dois artigos do decreto. Um deles autoriza empreendimentos que mantenham equilíbrio ecológico nos locais, “independentemente do seu grau de relevância”.

Outro, permitia “impactos negativos irreversíveis” na inexistência de alternativas viáveis para atividades de utilidade pública, contanto que houvesse medidas compensatórias e elas não gerassem extinções de espécies.

Para Lewandowski, as disposições do decreto “ameaçam áreas naturais ainda intocadas ao suprimir a proteção até então existente, de resto, constitucionalmente assegurada”.

Ele diz que a permissão, “dentre outros aspectos negativos”, de que cavernas de máxima relevância sofram impactos desde que cumpridas algumas condições são “incompatíveis -dada a sua conspícua vagueza- com o imperativo de proteção desse patrimônio natural pertencente, não apenas aos brasileiros, mas a própria humanidade como um todo”.

“[O decreto] imprimiu um verdadeiro retrocesso na legislação ambiental pátria, ao permitir -sob o manto de uma aparente legalidade- que impactos negativos, de caráter irreversível, afetem cavernas consideradas de máxima relevância ambiental, bem assim a sua área de influência, possibilidade essa expressamente vedada pela norma anterior”, disse o ministro em sua decisão.

Lewandowski destaca que a área de influência de uma cavidade subterrânea é importante fonte de nutrientes e ecossistemas e também o local onde vivem espécies responsáveis pela entrada de alimentos nas cavernas, como os morcegos.

Ainda diz que o conceito de “utilidade pública” mencionado pela nova regra é “juridicamente indeterminado” e confere, “por sua amplitude e generalidade, um poder discricionário demasiadamente amplo aos agentes governamentais responsáveis pela autorização dessas atividades com claro potencial predatório”.

Com base em avaliações de cientistas, o ministro afirma que a exploração das cavernas pode ocasionar o desaparecimento de formações geológicas que incluem restos de animais extintos e vestígios de ocupações pré-históricas.

“E não é só: os possíveis danos aos sítios arqueológicos abrigados nas cavernas podem, até mesmo, impactar negativamente o estudo da evolução da espécie humana”, diz.

Além disso, Lewandowski aponta que recursos hídricos subterrâneos podem ser comprometidos com a destruição dessas cavernas.

A suspensão determinada pelo ministro vale até o julgamento final, que ele afirma que deve ser feito em plenário, por todos os ministros do STF.

Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro defendeu o decreto. “Esse decreto chama-se decreto das cavidades. Se tem buraco de tatu aqui, se tem distância de 10, 20 metros, não pode fazer nada. Então não pode fazer nada no Brasil todo. Nós amenizamos essa questão aqui. Para o Brasil poder crescer, pô”, disse o presidente a apoiadores.

O decreto poderia facilitar a construção de uma fábrica da cervejaria Heineken em Minas Gerais, que foi embargada em setembro do ano passado pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) por risco de danos ao sítio arqueológico onde foi localizado o crânio de Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado nas Américas. Em dezembro, a empresa desistiu do projeto.

Obras em rodovias com interferência em cavernas também poderiam ser facilitadas pela medida.

O decreto de Bolsonaro foi assinado no último dia 13 e mantém as classificações de relevância das cavidades naturais em máxima, alta, média e baixa, mas revoga uma regra de 1990 que proibia que as cavernas com grau de relevância máximo sofressem impactos negativos irreversíveis.

 

 

uol

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